sábado, 13 de junho de 2015

Uma aventura na praia

Final de semana prolongado, ano de 2010. Papai de folga, juntamos nossas trouxinhas e junto com o Joaquim, a Cristiane e o Igor, fomos passar uns dias, em Caraguatatuba. É sempre muito difícil viajar com a Taymara, não importa se vamos ficar alguns dias, ou um mês fora. Somos obrigados a praticamente fazer uma mudança. Muitas malas, o carro abarrotado de aparelhos mais parecia uma ambulância do que um veículo de passeio. 
O trajeto foi difícil. Taymara passa muito mal quando anda de carro, na época ela ainda não tinha feito a traqueostomia. Foi Quase o caminho todo desmaiada, enfim, chegamos. 
Era um belo dia do sol então, não pensamos duas vezes. Largamos as malas no apartamento e fomos direto para a praia. Ao chegarmos, notamos que na barraca ao lado havia uma grande família, dentre eles uma grávida prestes a dar a luz. 
Como Taymara não andava por ai com uma placa dizendo que ela era doente, Fátima gentilmente alertou: "Olá! Minha filha tem uma doença e pôde convulsionar a qualquer momento, por isso peço que não se assustem. Estamos acostumados a lidar". 
A tarde transcorria normalmente, nós estávamos alegres, Taymara cade vez mais bronzeada, ficava linda. Como disse anteriormente, ela ainda não tinha traqueostomia e vivia o auge das paradas respiratórias. 
Dito e feito. De uma hora para outra todo aquele momento de felicidade em família transformou-se em desespero. Taymara começou a ter uma parada respiratória. As pessoas, assustadas, se aglomeraram e a família da mulher grávida revoltou-se. 
"Como eles podem ser tão irresponsáveis, trazer uma menina neste estado para a praia, além de ela correr o risco de morrer minha esposa, grávida, está passando mal, vou chamar a polícia", esbravejou revoltado o marido. 
À aquela altura, mesmo com os ânimos tensos, não nos preocupávamos com a opinião dos outros. Só queríamos reanima-lá e sair dali, antes que a polícia chegasse e todos fossemos parar atrás das grades. 
Neste meio tempo o guarda-vidas da praia chegou, pediu para que todos os curiosos se afastassem dizendo que a família sabia o que fazer.
Nós mesmos reanimamos a Taymara e conseguimos sair dali com ela viva e em boas condições. Foi só mais um susto dentre tantos outros. Mas desta vez, por muito pouco, a família de malucos não foi linchada pelo povo. Eles não sabem o que é ter uma pessoa com doença grave na família. 
Bem ou mal, a Taymara precisava viver sua vida, ter seus momentos, curtir sua praia. Jamais deixaríamos de fazer isso por ela. Não importa o que os outros pensem, o importante para nós é vê-la feliz. 

Essa é uma foto de Taymara na época

sexta-feira, 12 de junho de 2015

Agradecendo a quem nos encaminhou

Muitas vezes, quando fico olhando para o nosso céu, fico imaginando: "puxa, o cara lá de cima gosta mesmo da gente". Penso, como nos conhecemos lá em cima, são as minhas conjecturas, independente de religião. Penso que alguém chegou para mim e fez "Psiu! Quero te apresentar uma pessoa". 
Devo ser um amor neste lugar, seja ele qual for, pois, prontamente sorri para a Taymara e disse: "muito prazer". Devo ter dado risada, porque imagino que sejamos todos uns bobões, que achamos tudo lindo quando não estamos nesse mundo cão. 
Assim conheci a Taymara, que também queria me apresentar a uma pessoa, sequência errada é claro, porque o Felipe nasceu primeiro mas, não sei como isso funcionaria. Então, neste caso, a Taymara disse para mim: "Este é o Felipe, gostamos muito de você". Continuo sonhando. "Gostaríamos que você fosse a nossa mãe pois, acreditamos que você não desistirá de nós", disseram eles. Em meu sonho ainda não encaixei a escolha do marido, e do pai mas, acredito que por ser um grande homem e muito trabalhador nós o escolhemos. Não gente, ele também ainda não desistiu.
Acordei, tudo realidade mas, não nos mandaram sozinhos. Nos enviaram médicos humanos, maravilhosos e amigos. Muitos anjos sinceros que suprem qualquer falta de amor que poderíamos sentir. Eles seguem conosco essa jornada com muita paciência. 
Muitas vezes saio do prumo e o nosso querido neurologista consegue me recolocar novamente nos eixos. É uma sensação estranha. Posso estar péssima, adentro ao consultório, ele pode me dar a pior noticia do mundo, já chorei lá dentro, mas, apesar das noticias, muitas vezes ruins, acabamos sorrindo. Fico pensando se o deixo carregado pois, sempre saio do consultório leve, é incrível. Gostaria que todos que tem algum problema de saúde tivessem esta oportunidade. Temos também nossos pneumologistas, que quando nos abraçam transmitem força. O que quero dizer a vocês é que a HSAN é horrível, é feia, má, mas, nos rodeou de anjos que muitas vezes nos fazem sorrir em momentos em que estaríamos chorando. Eles nos trazem paz, amor, e cada dia mais, mais e mais, só anjos bons, os ruins, não conseguem nos atrapalhar. Hoje quero agradecer a todos, principalmente ao cara lá de cima a quem dou tanto trabalho e a todos os nossos amigos. Do nosso modo, amamos cada um de vocês.


Nossa família, unida, firme e forte na luta


quinta-feira, 11 de junho de 2015

Erva daninha

Vida, um jardim florido. Todos os nossos problemas são as ervas daninhas. Elas acabam destruindo nosso jardim. Parece ironia, mas se fosse só o HSAN, não, somos humanos não é? Temos todos os tipos de problemas que qualquer um tem. 
No momento, me encontro bem chateada e felizmente não é por causa do HSAN. A doença, por incrível que pareça, floreou nosso jardim. Quantas pessoas maravilhosas nós conhecemos, cruzaram nossos caminhos, e quantas outras almas boas ainda iremos conhecer. As ervas daninhas arrancamos uma a uma mas, como penso que estamos aqui para aprender, tem uma flor que insiste em ser erva daninha. Quando menos esperamos essa flor grita, não respeita a situação que estamos vivendo, tentamos rega-la, todos os dias. Quando parece que se aquietou, que irá florir, levamos um susto tremendo, ela grita novamente e nos xinga. 
Estamos cansados. Sei que não podemos ter somente flores em nosso jardim. Sei que as ervas daninhas nem florescem. E esta, nossa! nos engana sempre, ameaçando a florir, mas nunca chegando a virar de fato uma flor. Isso sim, me leva a exaustão. Pela primeira vez estou falando para o meu filho o que sinto e estou chorando, desta vez não é sobre o HSAN. Minha filha está desmaiada, pelo menos não está ouvindo, ela não lê, normalmente lemos para ela. Sei que meu filho esta sentindo o mesmo que eu. Consigo mostrar a vocês que tenho lágrimas sim. Meu tipo é diferente do da Taymara. Gente nosso blog é para ser alegre mas, eu sou bocuda. Engulo, engulo, para proteger meus filhos. Imagino que todos os problemas que outras pessoas tenham sejam talvez até piores, ou tão difíceis como os nossos. Todos os dias rezo para que está flor vingue. Caraca! Ela pega a gente de surpresa. Eu só não consigo entender porque ela não cansa. Vendo a gente tão quietinhos em casa, não nos da paz. Já passei de tudo nessa vida, até parece letra de música. Preciso engolir todos os dias esta erva daninha, que só sorri quando quer, que só faz o que quer. Um dia vai passar, mas eu já entendi que não será enquanto eu estiver aqui. Ela não quer ser flor, pelo menos para mim. Para os meus filhos talvez até tente, mas muitas vezes não consegue. A todos vocês que tem em suas vidas suas ervas daninhas, muita força. Desculpem não ser o foco do blog, mas eu quero viver e não ter a vergonha de ser feliz, junto com a minha família. Ninguém tem o direito de destruir isso. Obrigado à todos por me deixar desabafar. Força à todos vocês. Vamos superar. 

Que as ervas daninhas jamais destruam nosso jardim florido

quarta-feira, 10 de junho de 2015

O roteiro inacabado

Como ajudar a minha filha a entender que não pode mais voar? Todo dia ela pedia, "mamãe, quero minha carteira de trabalho. Vou trabalhar muito, ganhar dinheiro e te dar o mundo, cuidar muito de você". Difícil pois, com a síndrome se desenvolvendo ela foi piorando dia após dia, já seria uma tremenda sorte ela se formar na faculdade. Taymara sempre insistiu, dizia que tinha que trabalhar para ajudar a humanidade. Caramba! tanta gente fugindo de trabalho e ela desesperada por um. Arranco forças não sei de onde e digo asperamente: "não percebeu ainda que na sua área será impossível você conseguir um trabalho?" Ela tem uma vontade tão grande que não consegue enxergar isso. Com aquele seu rosto angelical ela pergunta: "porque mamãe? eu aprendo fácil você pode me aguardar do lado de fora, se eu passar mal você me socorre". Tive que criar uma casca dura para conseguir suportar tudo isto Ela insistiu tanto que um dia lá fomos nós ao Poupa Tempo, fazer sua carteira de trabalho. Hoje não iremos nos alongar muito porque estou tentando aceitar e entender porque alguns seres humanos ainda se revoltam sem motivo, enquanto outros, que tem tantos motivos para se rebelar contra o mundo, são apenas anjos. Vamos mostrar pra vocês a alegria da Taymara com a sua carteira de trabalho na mão, nunca vimos alguém tão feliz. Até este sonho foi por água à baixo. Podemos brincar muitas vezes mas, gostaríamos mesmo é de nunca termos sido apresentados ao senhor HSAN. Nos meus sonhos queria que isso tudo fosse apenas o roteiro de um filme que um dia seria lançado, e sendo assim não teríamos que vivenciar todo o ocorrido, e o que de pior possa vir pela frente. Sei que vamos sempre tirar algo bom, ou engraçado, das novas situações, quero mesmo saber que fim terá este roteiro. Boa noite a todos.

Momento único: A felicidade de Taymara com sua carteira de trabalho


Taymara desabafa

Ajuda

Julgamentos, omissões, críticas, perdas. Família, amigos, dificuldades, lágrimas, alegrias. Lindo, sol, noite, escuridão, diagnóstico, HSAN. Totalmente desconhecido. Não mata, felicidade! Vai nos tirando as coisas aos poucos. Tipo severo, tirando minhas forças, tirando minha sensibilidade, não sinto cheiros, não sinto gosto, não posso mais comer, HSAN, sem cura. Trato os sintomas. Notícia triste, horrível para mim. Meu irmão é portador, sem cura, sem estudo sem pesquisa pro meu tipo severo e raro. Totalmente diferente o meu tipo, do meu irmão e da minha mãe. Seria uma mistura entre a genética de meus país? Genoma,.. Porque tão difícil ser alcançado? Só isso poderia, nos dia de hoje fazer com que não me torne vegetativa pois não atingiu meu intelecto. Sou inteligente, posso estudar para ajudar as pessoas, mas minha traqueostomia aberta não permite. Preciso do médico, do homem cientista, geneticista, frio, pois claro, não pode se envolver sentimentalmente em nenhum dos casos que pesquisa. Expectativa, nenhuma, mas sou feliz assim, ainda consigo ser feliz.

Taymara chorando (sem lágrimas); Momento de emoção


terça-feira, 9 de junho de 2015

Desistir jamais

Nos últimos dois dias nosso blog foi divulgado nas páginas do jornal A Tribuna, e no G1 portal da globo na internet. Agradecemos muito aos colegas de profissão, Carlota Cafiero e Claudio Vitor Vaz, responsáveis pela publicação em A Tribuna, e também agradecemos ao jornalista Rodrigo Martins do G1, que escreveu a matéria que está no ar no portal. Essas duas reportagens trouxeram grande repercussão, e com ela, diversas dúvidas sobre a doença.
Como já contamos, a cada nova internação de Taymara, temos que falar novamente todo o histórico da doença, devido a complexidade da mesma. Se é difícil até para médicos de grandes hospitais entenderem o que é o HSAN, imaginem para os leigos na área da saúde.
Hoje recebemos diversas mensagens com perguntas recorrentes. Afinal, Taymara sente ou não sente dores? Pois bem, o HSAN causa a perda de sensibilidade periférica, para ser mais claro, Taymara não sente dores nas mãos, pés e por toda parte externa do seu corpo. Porém, ela ainda sente dores viscerais, na parte interna do corpo, isso explica as dores abdominais relatadas na matéria do G1 e que suscitaram algumas duvidas.
Gostaríamos de deixar claro que existem variados tipos da doença, como exposto em nosso blog na área, conheça o HSAN. Lá estão descrito os 5 tipos já constatados da neuropatia. No caso de nossa família, nenhum dos pacientes se encaixa em qualquer dos tipos conhecidos, por isso são tão raros. Só chegou-se a conclusão que se tratava de HSAN, através da biopsia de nervos realizada em Taymara no ano de 2011, nela constatou-se perda das fibras mielinas de pequeno porte, o que atesta o diagnóstico. A conclusão então foi que devido aos sintomas dos pacientes em questão, tratava-se de um novo tipo de HSAN, ainda não descoberto. Por isso necessitamos tanto que seja feito um estudo completo do genoma de cada membro da família, para assim podermos chegar ao conhecimento de qual é este novo tipo da doença.
Como mãe, hoje sei que tenho um tipo bem menos severo que o de meus filhos. Isso não importa. Se hoje não conhecem a neuropatia, imagine quando engravidei. Fizeram essa pergunta "Por que os coloquei no mundo?" fiz isso por amor e faria novamente, eles são seres humanos maravilhosos, verdadeiros exemplos, quem os conhece sabe. O pré-natal dos meus filhos apresentou resultados excelentes, eram 100% normais. Para quem ainda não entendeu, a síndrome é genética.
Pensamos durante anos se divulgaríamos nosso caso. Pois sabíamos que no mundo ainda existem pessoas ignorantes que por desconhecimento ou até mesmo maldade, fariam comentários sórdidos. Antes mesmo de revelar ao mundo, já havíamos passado por esse tipo de julgamento, até mesmo dentro de nossa família. Ouvimos de médicos residentes que HSAN não existia, porque não ouvir de um leigo. O pior de tudo, para esses médicos a doença não existia, diziam que os resultados dos exames eram falsos e que eu estaria fazendo isso afim de obter ajuda financeira do governo, este eu peguei pelo pescoço. Sem examinar a minha filha, ele teve a petulância de dizer que quem fez a traqueostomia fez sem necessidade. O residente perdeu a oportunidade de aprender muito com um caso único na história da medicina, foi retirado do atendimento a paciente, e no fim de tudo veio pedir desculpas. Aceitamos, mas futuros médicos como este não deveriam clinicar jamais. Algum dia ele ainda pode matar alguém devido a sua prepotência. Ele só nos pediu desculpas porque todos os exames foram refeitos e os resultados foram ainda piores que os primeiros.
Hoje eu chorei sim, mas porque me recordei desta dura passagem e percebi que o ser humano não muda. O que nos deixou feliz diante da repercussão de hoje, foi receber a ajuda de pessoa que não tínhamos contato há muito tempo, e sermos apoiados por pessoas que nunca nos viram. As palavras de apoio foram muito gratificantes. Obrigado à todos que se uniram a nossa causa, juramos à todos aqueles que nos apoiaram que jamais desistiremos.

Taymara e Felipe juntos, buscando forças um no outro



O dia D

Dia 18 de maio de 2011, inesquecível para todos nós. Abracei forte a Cristiane que pediu para que eu ficasse firme. Iniciaram-se os procedimentos básicos antes de qualquer cirurgia, banho com sabonete especial, bocejo especial, roupinha de centro cirúrgico, tudo preparado. Estava aguardando que dessem os medicamentos padrões, mas ninguém chegava.
Óbvio que a cirurgia atrasou, houve um transplante de emergência que adiou o procedimento de Taymara. A ordem do neurologista, até hoje, é que ela tome todos os principais medicamentos, antes de uma cirurgia, com o mínimo de agua possível. Era a primeira vez, ninguém quis me atender, um empurrava para o outro. Claro que sem os remédios, em jejum, o quadro de Taymara só foi piorando e eu fui me enervando ainda mais.
A cirurgia que estava inicialmente marcada para às 8h, foi remarcada para as 13h, ou seja, a paciente ficaria no mínimo mais 5 horas de jejum. Taymara teve uma forte convulsão. Eu andava sempre com os remédios dela, não pensei duas vezes. Não toquei a campainha da enfermagem e dei os remédios, mesmo sem ordem médica. Até hoje, o hospital não fornece os remédios que Taymara normalmente toma, principalmente os importados, tínhamos que bancar todos. Com os remédios minha filha ficou mais tranquila. O entra e sai de médicos e enfermeiros não parava, até que veio a anestesista. Muito simpática repetiu todas as perguntas, mas pelo menos me pediu desculpas, explicou que era um procedimento padrão do hospital, disse que se Taymara não dormiu quando colocou o marca-passo é porque não pegou um bom anestesista. Não respondemos nada. Comuniquei o atraso ao nosso neurologista, disse que tinha dado os remédios por minha conta e relatei isso a anestesista, que ficou surpresa com minha atitude, mas acatou. Após cerca de 30 minutos veio a enfermeira chefe dando um piti porque eu havia dado os remédios, e lá fui eu discutir sobre HSAN. Neste interim nada da cirurgia começar, então reclamei, pois a Taymara não estava nem no soro e já estava próximo o horário de uma nova leva de remédios, segurei, pois estes não eram tão relevantes. Por volta das 17h30, finalmente foram busca-lá. Ela me olhou nos olhos e pediu: "Mamãe, peça ajuda por mim, sei que vou ficar melhor". Eu e Cristiane fomos com ela até a porta do centro-cirúrgico. A esta altura eu já soluçava, não conseguia me controlar, todos me olhavam. Ela tomou minha benção disse que me amava, abraçou Cristiane, dizendo que a amava e entrou. Fomos tomadas pela emoção, Cristiane começou a chorar muito, nunca havia visto aquilo, primeira vez. Todos olhavam para nós e quanto mais olhavam, mas chorávamos. Era noite de semi-final de Libertadores, o Santos, time de coração da família, jogaria uma partida importante, mas antes de rumarem ao estádio do Pacaembu, Felipe e Joaquim tinham uma missão, levar o menino Igor para a mãe. Cristiane à aquela altura, mais calma, foi até o carro buscar seu filho, mas quando viu os meninos não aguentou, novamente começou a chorar. Aquela imagem assustou Felipe e Joaquim que tentaram acalma-lá, em vão. Não me lembro ao certo quantas horas durou aquela cirurgia, mas para mim cada minuto foi como uma eternidade. O telefone do quarto tocou e era o médico nos chamando para conversar. Muito centrado pediu para que nos sentássemos e falou que ainda não sabia ao certo porque a traqueia dela se fechava. A ideia inicial era por apenas um pequeno bottom, mas foi necessário por uma canula maior para que a traqueia não voltasse a se fechar. Novamente a anestesia não pegou, então logo depois da cirurgia ela já pôde voltar para o quarto. Estava corada como há tempos não via. No começo ela não podia falar, se comunicava via lousa. O médico assistente veio ao quarto e disse que estava tudo certo. Taymara se sentou pela primeira vez, após a cirurgia e quando vejo ela estava com uma canula cumprida saindo do pescoço, para mim aquilo era um microfone. Desesperada comecei a chorar e dizer: "Ela está com um microfone, colocaram um microfone na minha filha. Todo mundo vai tirar sarro". Então chega o nosso neurologista, Taymara estava muito feliz e escreveu na lousa que nunca havia respirado tão bem na vida. Eu continuava chorando, então o doutor perguntou porque eu estava daquele jeito. Só conseguia repetir a mesma frase: "colocaram um microfone na Taymara". O médico então pediu para que conversássemos fora do quarto. Ele disse: "Não sei qual é o seu problema. eu também não queria isso para ela, mas hoje vendo o sorriso dela, vendo ela corada, teria feito a muito tempo. Acertamos. não sabemos porque, mas acertamos. Sei que não é tão fácil assim aceitar, mas ela precisa de você, não você dela".
Esta foi a primeira e ultima vez que chorei desta forma. Eram lágrimas de indignação, revolta, há um inimigo ali e não sei como combate-lo. Ele é invisível, não se apresenta e aos poucos vai judiando do corpo físico de minha filha. Descobri que rir é o melhor remédio. Já cantávamos esta musica da Xuxa quando eles eram crianças. Nunca imaginei que essa frase seria o refrão de nossas vidas.

Dando uma gargalhada que não custa nada e é sensacional

domingo, 7 de junho de 2015

A decisão

A internação foi uma batalha. Cada novo médico que entrava no quarto tínhamos que falar novamente todo o histórico da doença. Explicar a qualquer pessoa o que é o HSAN, é algo muito difícil. Imagine explicar para todos os médicos do HCOR. Parecia que estávamos falando grego. Era uma confusão atrás da outra. Ninguém entendia nada. Perguntavam o que significava esta sigla. Falávamos e explicávamos que existiam pouquíssimos artigos sobre a doença, todos eles em inglês. Por mais que falássemos, eles continuavam a bater na tecla de que a Taymara era epilética.
Com a chegada do nosso neurologista, pude me acalmar pois ele assumiu o caso junto ao cardiologista do hospital. Após vários exames, constatou-se um deslocamento do marco-passo. A equipe cardiológica então pediu um tempo para avaliar a situação, pois esse deslocamento era incomum na faixa etária dela. Claro que os sintomas continuaram. Eu evitava chamar a enfermagem e após uma longa conversa com nosso neurologista, pedi desculpas por ter escondido dele as paradas respiratórias e por ter sumido alguns meses do consultório. Por ser um profissional de excelência, ele 
continuo pesquisando incansavelmente, mesmo com a nossa ausência. Sendo assim, estava mais do que preparado para enfrentar as feras que diziam que essa doença não existia. Ao ser informado das paradas respiratórias pediu para que eu chamasse a enfermagem caso ocorressem, pois esse era um sintoma que poderia levar a Taymara a óbito, disse que não tinha mais como eu fazer nada sozinha. A enfermagem ia ao quarto de hora em hora verificar os sinais vitais. Em um desses momentos ela teve uma parada respiratória. Os enfermeiros pediram para eu sair e acionaram o código azul do protocolo, que eu leiga não sabia o que significava. 
Foram segundos, a "swat" entrou quarto adentro, várias pessoas e algumas maquinas. Eu estava calma já que estava acostumada a vê-la recobrar a consciência, só que desta vez ela já estava roxa, todos estavam desesperados, era a equipe da UTI. Fiquei desnorteada, eles iriam intubar a Taymara, não pensei um segundo, é verdade, poderia ter matado minha filha mas empurrei a enfermeira e como uma leoa protegendo sua cria me joguei em cima do corpo dela. Eles aplicaram uma injeção que não sei do que era. Ouvi falarem: "Ela esta voltando. Vamos chamar a equipe da traqueostomia, fazer a cirurgia". Os enfermeiros me acalmaram, disseram que não iriam mais intuba-lá assim sai de cima dela, fui retirada do quarto. Liguei para o neurologista que rapidamente apareceu.
A junta médica reuniu-se e chegou a conclusão que não sabia quais eram as causas das paradas respiratória. Os médicos decidiram que a traqueostomia era a única maneira de salvar a paciente. Nosso neurologista pediu para conversar conosco. Normalmente ele não se sentava, mas dessa vez estava diferente. Ele nos explicou que do jeito que ela estava corria risco de vida. Prontamente interrompi e disse: "Eu não concordo e não imagino minha filha com uma traqueostomia". Taymara imediatamente perguntou: "Eu vou 
respirar melhor? Mãe, não fica nervosa, estou assustada, é horrível ficar sem respirar". Eu nervosa retruquei: "Você nem sabe se isso vai resolver". O médico explicou que o procedimento seria eficaz sim. Sai do quarto. Os dois ficaram conversando e a própria Taymara assinou a autorização para a realização da cirurgia que ocorreu no inesquecível dia 18/05/2011. Eu surtei e quase matei a Cristiane do coração. Enquanto a Taymara estava com a enfermagem fui até o corredor e liguei para a Cris soluçando, não conseguia falar. Ela me pedia calma, até que falei "Vão furar a Taymara". Ela desesperada tentou me acalmar dizendo que ela 
precisava e que iria estar ao meu lado no horário da cirurgia. Eu não conseguia aceitar. Tentei segurar as emoções na frente de minha filha, a noite após ela adormecer fui para a porta do quarto e derrubei-me em lágrimas. Assim conheci nosso anjo, a enfermeira Marcela. Ela me abraçou forte e disse: "Eu sei o que está passando mãe. Olhei para sua filha e vi um anjo e mesmo sem conhece-las direito posso dizer que vocês são pessoas maravilhosas. Chore tudo que você tem vontade e depois seja forte como você sempre foi. Ela irá melhorar". Naquela época eu era um pouco anti-social, mas me senti acolhida. Vi que não estava sozinha. Eu tinha a Cris, a Vilma, 
minha irmã Dulce, a Carol, o Joaquim e a Milena. Me acalmei e sem dormir fiquei pensando o porque  disso tudo. No fundo ainda encontrei forças para agradecer a Deus por ter a graça de contar com pessoas amigas e sinceras. A noite do dia 17 passou rápido, para minha surpresa. A cirurgia estava marcada para às 8 horas e 7h30 minha fiel escudeira adentrou ao quarto. Durante a internação conheci o pneumologista que faria a cirurgia, seu assistente, anestesistas e mais de 10 pessoas. Existe o prontuário e isto ocorre até hoje, fico de saco cheio. Todas as vezes tenho que responder as mesmas coisas. Falar todo o histórico para cada pessoa diferente. 
Parece que você esta passando por um poligrafo, são normas do hospital, sendo assim continuo respondendo a todos os formulários, só que hoje em dia, pelo menos, eles já conhecem o HSAN.   

Taymara rodeada por seus Anjos da guarda Joaquim e Cristiane