sábado, 6 de junho de 2015

O rebu no PS

O meu drama em relação a traqueostomia começou na internação repentina após a nossa primeira consulta com o cardiologista do HCOR (para entender melhor leiam o texto "explicando o inexplicável"). Fiz de tudo para demove-lo da ideia de interna-la, mas ele estava irredutível. Depois disso não tive mais acesso a ele. Estava no Pronto-Socorro do hospital, eu e Cristiane nos revezamos no acompanhamento à Taymara enquanto esperávamos pela liberação de um quarto para a internação. Enquanto isso íamos tentando localizar nosso neurologista, mas nossos celulares não tinham sinal no PS e não tínhamos como deixa-la sozinha, um desespero. Cristiane queria ir à rua para fazer a ligação mas eu, nervosa com a situação, não queria que ela nos deixasse.
Estavamos tentando avisar a família quando de repente Cristiane grita, Taymara estava tendo convulsões por isso iria ser transferida para a UTI do Pronto Socorro. Joguei para o alto tudo o que tinha nas mãos e sai correndo afim de impedir que fosse feito qualquer procedimento mais invasivo (mesmo sabendo que existe um padrão internacional de procedimento para os casos de convulsão), não queria que ela fosse sedada. Passei pela porta do PS, o segurança já estava de cara feia por causa do nosso entre e sai e desta vez quando passei correndo ele levantou e correu atrás de mim. Ela já não estava mais no mesmo leito, me desesperei, perguntei na enfermagem aonde ela estava, elas responderam: "Ela esta sendo tratada na UTI senhora" eu disse: "O que? minha filha não fica sem mim". As enfermeiras retrucaram: "É proibida a entrada de acompanhantes na UTI". Pensei rapidamente, segurança de um lado muitas pessoas nos corredores, respondi: "Ok, Obrigada" e quando elas relaxaram simplesmente meti o pé na porta. Taymara já estava com alguns aparelhos, todos começaram a gritar para eu sair dali. Vi um deles com uma seringa na mão, iriam sedar ela, não pensei duas vezes, me joguei em cima do corpo dela, me agarrando como um polvo à maca e os enfermeiros gritavam, mas não sabiam como proceder. Chamaram todos os seguranças. Taymara estava desmaiada e eu só pedia para que não dessem calmante. Erroneamente eu dizia que era ordem do neurologista, mas eu como mãe, após vários episódios de extremo risco sentia em meu coração que uma sedação durante uma crise convulsiva ou parada respiratória, poderia leva-la a um coma irreversível. Quero deixar bem claro que isso era um sentimento de mãe, não havia nenhuma prescrição médica sobre como proceder em momentos como este. Os sinais vitais de Taymara foram se normalizando e os enfermeiros pediram para que eu saísse. Enquanto isso, Cristiane já tinha conseguido contato com a secretária de nosso neurologista. Os seguranças chegaram e me recompus, mas disse a eles que não deixaria a UTI enquanto não falasse com nosso neurologista. Lembram-se do filme à espera de um milagre? Os seguranças eram só um pouquinho maior que o ator principal. Eu, mesmo gorda como um pote, virei um mero brinquedinho nas mãos daqueles projetos de jogadores de futebol americano, que me retiraram na maior boa. Sai da UTI, carregada pelos braços, pedindo para descer, com as perninhas para o alto abanando.  
Não parava. Mesmo longe da Taymara ficava reclamando o tempo todo, até que me chamaram dizendo que se eu estivesse mais calma o neurologista do hospital gostaria de conversar comigo. Nem conto para vocês a cara da Cristiane, não tem como descreve-la, só me pedia para ter calma.
Por ética, não citaremos o nome do neurologista, que mal me cumprimentou e perguntou qual era o problema com diagnostico, pois para ele Taymara era simplesmente epilética. Respirei fundo e calmamente tentei explicar: "Doutor temos um diagnóstico, no momento é somente clinico, mas com alguns exames complexos". Ele me interrompeu e disse: "Pode parar. O médico aqui sou eu. Ela tem epilepsia". Peguei minha inseparável pasta preta, saquei os laudos com o diagnóstico e o prepotente doutor mandou eu joga-los fora. Ai me irritei: "Já que o senhor é o bam-bam-bam, que aliás é o tipo de médico que mais tem nesse hospital, se algum dia tiver ouvido falar no diagnostico que vou lhe dar, o senhor esta autorizado a colocar a mão na minha filha enquanto o neurologista dela não chega". Ele responde: "Dentro deste hospital o neurologista dela sou eu. Sou o chefe desta área". Comecei a rir e perguntei: "Alguma vez já ouviu falar em HSAN?". Ele mudo, ficou sem resposta. Eu cheia de razão disse: "Caiu na pegadinha não é? Sou gorda mas não sou o Faustão". Ele finalmente abriu a boca perguntando o que significava a sigla HSAN. Para meu alivio ele foi chamado por uma enfermeira, pois o neurologista de Taymara estava ao telefone. Após a ligação ele retornou, não me deu explicação nenhuma mas autorizou que eu ficasse ao lado da Taymara dentro da UTI.
Além de ter sido presenteada por Deus por termos o melhor neurologista do universo, sempre soube que ele nunca iria nos faltar, era credenciado naquele hospital, só não fazia parte da equipe clinica. Como vocês podem perceber, é muito difícil fechar este diagnóstico. Só chegamos nele pela paciência, compreensão, profissionalismo e humildade do nosso neurologista. Pois ele sempre dizia que juntos iriamos descobrir o que a Taymara tinha. E foi exatamente isso o que aconteceu. Nosso muito obrigado a ele. Amanhã contamos o restante dessa estória.

Os seguranças do hospital eram do tamanho do homem ao centro da imagem

quinta-feira, 4 de junho de 2015

Conversando com o leitor

Primeiramente gostaríamos de agradecer à todas as pessoas que tem compartilhado amplamente os links do nosso blog. Muitas pessoas tem nos perguntando sobre a parte cientifica da doença. Para nós é difícil falarmos especificamente, pois não existem muitos estudos a respeito. O pouco que sabemos já está relatado no blog. 
É possível perceber através de nossos relatos que o caso da Taymara é especialmente raro. Tudo que se sabia sobre HSAN no mundo, foi praticamente por terra com o caso dela, pois ela claramente não se encaixa em nenhum tipo já diagnosticado da doença. É como se tivessem colocado todos os tipos já catalogados de HSAN em um liquidificador, batido junto com mais alguma coisa ainda desconhecida e como resultado deu a Taymara.
Isto posto, vamos falar sobre mais um tema ao qual temos sido constantemente indagados. Porque não levar o caso á televisão? Pois é, já recebemos diversas propostas para irmos a telinha mas como já reiteramos tudo o que não queremos é aparecer, nos promover em cima da nossa própria tragédia. 
Acreditamos sim que um dia teremos que ir à televisão mas só estamos dispostos a tamanha exposição quando tivermos algo mais concreto em mãos. Se algum dia através do nosso blog, vir a nosso conhecimento alguma pesquisa em qualquer canto do mundo sobre a doença, ai sim, achamos que a televisão será útil.
Outra questão a qual somos frequentemente indagados é: Porque vocês não vão para fora do país? A resposta é simples. Nós e nosso neurologista estamos em constante contato com médicos em paises da Europa e dos Estados Unidos. Não há nenhuma novidade sobre a doença. Não é necessária nossa presença fisíca em outro lugar, basta apenas enviarmos nosso sangue para pesquisa.
Sendo assim a equipe do Convivendo com o HSAN espera ter esclarecido algumas duvidas recorrentes entre os nossos seguidores. Estamos abertos a novos questionamentos. Obrigado á todos.


                                       Foto do DNA humano em 3D

Explicando o inexplicável

Taymara tendo uma convulsão atrás da outra. Sim, já sabíamos lidar com a situação mas após horas cansativas e tristes, quando voltou a si, desta vez, Taymara reclamou de dor. Isso nunca havia acontecido antes, pois como já explicamos anteriormente ela não sente dores periféricas, devido ao HSAN. Pergunto eu: "Dor aonde minha filha, normalmente você não se queixa de dores após as convulsões? "Taymara muito fragilizada aponta para as costelas. Eu digo então: "Ah Taymara deixa de estória, você não tem dor, é a única coisa que você não tem". E ela responde: "Mamãe esta doendo muito". Eu me fazendo de durona digo: "Sem novidades vai. Estamos cansadas". 
Aos poucos fui notando que ela estava com dificuldades respiratórias, mas sua oxigenação estava normal. Perguntei novamente: "O que foi?" E ela disse: "Não consigo respirar. Quando respiro a dor fica insuportável". Fomos até o Pronto Socorro fazer um exame de raio-x. Chegamos ao PS com ela convulsionando. Após muita confusão finalmente fizemos o exame. Com o resultado em mãos o medico vira para mim e diz: "O que  é essa coisa enorme dentro dela?" Eu respondo: "Nada demais. Ela engoliu o meu celular de mil novecentos e lá vai bolinha." O doutor espantado com a resposta diz: "ahn!! O que?". Sem pestanejar levantei, catei o raio-x que estava em cima da mesa e saímos andando. Já no corredor o segurança do hospital me pega pelo braço. Eu indago: "Por que isso?" Nisto vejo o médico vindo novamente em nossa direção dizendo: "A senhora não tem educação, não pode fazer isso". Eu digo: "ah, posso sim. Não tenho educação. Mas sei muito bem diferenciar um marca-passo cardíaco de um celular. Então não nos perturbe senão irei direto ao conselho regional de medicina". Saímos andando sem olhar para trás.
Ao chegar em casa comparei o raio-x novo com um outro antigo e percebi que houve um deslocamento do marca-passo que agora estava pressionando uma das costelas. Esse era o motivo das dores. Entro em contato com o cardiologista da Taymara e descubro que ele está de férias. Fico desconcertada e acabo ligando para minha fiel escudeira, Cristiane. Ao contar o fato ela me dá uma luz dizendo: "Pata, só vejo uma solução, vamos levá-la para o HCOR em São Paulo, no cardiologista que operou o meu pai."
Ela conseguiu a consulta de emergência e lá fomos nós. Ao entrarmos no consultório, o doutor foi bastante atencioso com a Cristiane, os dois conversaram bastante, enquanto isso, Taymara estava em pé por mais de 5 minutos na mesma posição o que, por causa do HSAN, pode leva-lá a desmaiar. O médico pergunta: "E ai meninas quem é a paciente?" Apontamos para Taymara e ele pergunta o que ela tem, respondemos: "HSAN". Ele pergunta: "O que?" Nós rimos e ele bravo pediu para Taymara deitar na maca. Tarde demais. Taymara caiu convulsionando e com parada respiratória. O médico começou a gritar muito enquanto isso eu e a Cristiane tentávamos fazer os procedimentos para reanima-lá. Em meio a todo esse desespero o doutor pega o telefone e liga pedindo pela ajuda de outros médicos e pela presença dos seguranças. Enfurecido ele diz: "Essas duas malucas, pelo visto andam com essa menina deste jeito para cima e para baixo. Não percebem que ela pode morrer a qualquer momento." Os médicos cuidavam de Taymara enquanto eu e Cristiane tentávamos explicar ao cardiologista o inexplicável. Fomos conduzidas pelos seguranças à ala de internação, eu, totalmente desesperada, pois fomos simplesmente para uma consulta comum. Foi tudo muito triste e repentino. Este é o primeiro episódio que mais à frente iria culminar na traqueostomia.

Taymara (ainda sem traqueostomia) indo a uma festa com seu irmão Felipe

terça-feira, 2 de junho de 2015

A flor do meu jardim

Dentro do meu coração existe um lugar secreto, onde existe um jardim repleto de flores em que anjos especiais que cruzaram meu caminho habitam. Tenho vários. Alguns perderam-se pelo caminho, como flores que murcham com o tempo. Mas outros seguem vivos e radiantes. A cada dia que passa suas raízes ficam cada vez mais fortes, mesmo que não os veja.
Irei aos poucos falando algo de cada um. Ontem já falamos da Cristiane. Hoje voltarei um pouco ao passado mandando muitos beijos para minha flor Amanda Diniz. Agora quero agradecer a minha flor de lotus, a mais bela e pura de meu jardim, é tão especial que ao invés de chamá-la pelo nome, chamo-a apenas de flor. Demorei um pouco a conquistá-la principalmente por que muitas ervas daninhas nos cercavam quando nos conhecemos. Portanto quero deixar aqui, minha flor Milena, um testemunho de que nossa amizade seguirá conosco por toda eternidade. Que o cara lá de cima regue o meu jardim com amor, amizade e compaixão. Para que as poucas flores que ainda restam em meu belo jardim sigam firmes, belas e radiantes, trazendo a paz e a harmonia de que tanto necessito. Muito obrigado a vocês, flores do meu jardim. Que me iluminam e dão forças para continuar lutando. É por vocês que respiro todos os dias.

Taymara, em seu aniversário deste ano, e sua flor Milena
 
Taymara, Amanda Diniz e sua mãe
 

segunda-feira, 1 de junho de 2015

O anjo da guarda

Em meio a tantas dificuldades em nosso dia a dia só nos resta uma coisa, a fé. Essa energia que nos move faz a gente crer que cada um de nós tem um anjo da guarda que nos guia e nos dá guarida. Pois bem, Nossa situação é tão difícil que não nos bastava apenas ter um guardião dos céus. Precisávamos ter um anjo da guarda aqui na terra. Graças a Deus nós temos.
Nos momentos de dificuldade vemos com quem realmente podemos contar. Quando soubemos que o tratamento para a doença séria em um neurologista em São Paulo, perdemos a cabeça. Como faríamos? Nosso pai trabalhava demais, quem nos levaria? Foi aí que surgiu nosso anjo da guarda. 
Cristiane se ofereceu para nos levar, sabíamos que era difícil para ela. Comerciante, mãe de um bebê na época recém-nascido, como ela faria com o Igor, não tinha com quem ele ficar, então lá foi ele, bebezinho, com um mês de idade, junto para o hospital.
Agora perguntamos a você amigo leitor, você levaria seu filho recém-nascido, para um hospital para ajudar pessoas com as quais nem tem parentesco sanguíneo? Somente um anjo da guarda para encarar uma dessas.
Ao longo dos anos nossa saúde só foi piorando, as pessoas se afastavam, mas Cristiane, estava cada vez mais próxima. Sempre presente, fossem nas horas felizes ou nas mais difíceis, ela doava seu tempo e seu esforço a nos ajudar, sem querer nada em troca.
A essa hora o amigo leitor deve estar pensando, o que isso tem a ver com a doença? Nós respondemos, tudo. Não fosse pelos esforços de Cristiane não teríamos chegado até aqui. Por isso decidimos contar essa estória. Para que todos saibam que se não fosse pelo nosso anjo da guarda, possivelmente hoje vocês não estariam lendo esse texto.

Cristiane, na colação de grau de Taymara com o marido Joaquim

domingo, 31 de maio de 2015

Batalha pelo diploma - O início

Taymara teve uma convulsão e Infelizmente caiu no chão quebrando o braço. Neste período eu ainda não frequentava as aulas com ela e a engraçadinha havia se comprometido de levar as fezes de seu cachorro para a aula de parasitologia. E eu vendo o braço dela inchado queria lavá-la ao médico ortopedista. 
Ela se sentia fraca devido a convulsão e cismou que antes de ir ao médico teria que levar as fezes do animal a faculdade para não deixar o grupo na mão. O segurança da faculdade não queria me deixar entrar no campus.
Conseguindo entrar, lá vou eu com um saquinho cheio de fezes faculdade à dentro, chegamos no horário do intervalo, claro que Taymara está sem o uniforme pois não iria a aula, nisso ela aponta um professor que vinha em nossa direção. 
Então eu, sempre muito educada digo: "Bom dia com licença?" Ele simplesmente me ignora, vira para Taymara e diz: "Está pensando que faculdade é passeio? Volte para casa e ponha sua roupa branca ou então vá direto para o laboratório". Todos ficaram olhando, perplexos em nossa direção. Então eu disse a ele "falei com o senhor" ele rispidamente responde: "Não falo com quem eu não conheço". Taymara diz a ele: "Não posso ir para a aula, tenho que ir ao medico ver meu braço" eu rapidamente gritei: "Eu também não lhe conheço, dá para falar comigo?".
Ele saiu andando e eu e Taymara saímos atrás gritando: "só queremos entregar o coco, só queremos entregar o coco". Olhei para o inspetor e perguntei: "Aonde está a coordenadora?" Ele respondeu: "Pelo amor de Deus, ela está em uma reunião no auditório e não pode ser interrompida, você não vai conseguir entrar". 
Fui correndo pelas escadas. Ao chegar no auditório os seguranças não queriam que eu entrasse. Nisso já tinha uma multidão atrás de mim (e do coco) gritando pelo meu nome. Ao ouvir os berros a coordenadora saiu da reunião, pedindo para que eu tivesse calma e explicasse o que havia acontecido. Pegou as fezes para levar ao laboratório e me pediu para que levasse a Taymara ao hospital, também pediu desculpas pela má educação do professor e disse que iria tomar as devidas providências. Em breve eu teria um retorno.
Eis que assim começa uma saga bem complicada para mim. Pois começariam as provas e Taymara não poderia escrever pois havia quebrado o braço direito. Eu e o referido professor, hoje nos falamos, mas na época éramos arqui-inimigo. Por ironia do destino fui escolhida pelo corpo docente para escrever as provas de Taymara. Aguardem, vocês irão rir muito do que vêm pela frente nos próximos capítulos.

Taymara com ao amigos da faculdade